O envelhecimento da população, questões ambientais, quedas no índice de natalidade, falta de mão de obra, problemas de escolarização e agora, uma pandemia. Esse cenário trouxe à tona uma série de reflexões ao governo japonês sobre o futuro da economia do país.
Diante dos mesmos dilemas que afligem o mundo, o Japão deu início a um processo de transformação social, usando a integração de tecnologias inteligentes para melhorar a qualidade de vida das pessoas. Assim, nasceu o conceito de Sociedade 5.0.
Usado pela primeira vez em 2016, quando o governo japonês apresentou o seu 5º Plano Básico de Ciência e Tecnologia, o termo prevê a transição de uma sociedade comum para uma sociedade superinteligente.
Centrada no ser humano, a Sociedade 5.0 vai na contramão da era 4.0, focada em transformação digital, na indústria e dedicada à otimização e integração de sistemas produtivos.
A proposta é fazer com que esse novo modelo de sociedade permita que toda a inteligência criada por inovações, como IoT, Big Data, Inteligência Artificial, Realidade Aumentada e outros, seja adaptável a outras áreas do nosso dia a dia, como saúde, mobilidade, infraestrutura, entre outras.
Ou seja, usar toda essa inovação no longo prazo e incorporar na sociedade todo o conhecimento alcançado durante a 4ª Revolução Industrial - aliando tecnologias e pessoas.
Entusiasta do conceito, Yoko Ishikura, professora emérita da Universidade Hitotsubashi, em Tóquio, diz que essa combinação pode, além de resolver problemas, agregar valor à sociedade.
Para que esse programa se torne realidade, Yoko aponta que empresas, indivíduos e governos precisam mudar em sintonia.
OS PRINCIPAIS VALORES DA SOCIEDADE 5.0
Abertura, sustentabilidade e inclusão. Com a meta de promover vidas cada vez mais confortáveis, o objetivo é permitir que utilizemos nosso tempo para realizar tarefas mais carregadas de significado com maior qualidade de vida até idades mais avançadas.
Desenhando cidades mais seguras, menos estressantes e nocivas à saúde do que são atualmente, a inclusão surge como importante aliado nessa construção. Se é preciso ter capital para ter qualidade de vida, conforto, saúde, segurança, a sociedade 5.0 busca um mundo menos excludente, em que todos têm acesso igual aos benefícios que a tecnologia trará.
A sociedade do consumo foi o pano de fundo de muitos avanços. Entretanto, essa lógica trouxe outro efeito, uma exploração sem controle dos recursos naturais para que a produção e consumo continuassem em crescimento.
Tivemos como resultado a degradação de ecossistemas, escassez de recursos e mudanças climáticas. Na sociedade 5.0, a sustentabilidade é uma premissa para a evolução e adoção das tecnologias.
NOVAS RELAÇÕES DE TRABALHO
Impulsionada, especialmente, pela pandemia, é cada vez mais presente a ideia de que as empresas precisam criar novas relações de trabalho, bem como os governos precisam rever regulamentações e os sistemas de ensino serem atualizados.
O maior impacto da covid-19 no Japão, segundo Yoko, foi que a imposição de um isolamento social mostrou ao setor privado, ao governo e ao público em geral, que mesmo com tanta tecnologia em mãos, o país ainda teve muita dificuldade de incorporá-la quando foram atingidos por um desastre global.
Por essa razão, as ações para a Sociedade 5.0 por meio da transformação digital são ainda mais significativas.
O trabalho remoto, necessário para responder ao aumento de casos da covid-19, tem sido difícil, especialmente para pequenas e médias empresas. Com infraestrutura inadequada e ainda muitas práticas baseadas em papel, a educação on-line também sofreu com alunos sem dispositivos e professores que não estavam preparados para ensinar a distância.
Segundo a especialista, um dos pilares da sociedade 5.0 é o modo como o ser humano lida com a força de trabalho, e por isso, é preciso descobrir meios de desenvolver novas habilidades sem deixar de lado as coisas que mais nos tornam humanos.
Nas palavras de Yoko, nosso formato atual faz com que esse senso de liberdade criativa - muito valorizado nessa nova era - vá se perdendo com o tempo por causa das limitações impostas pela sociedade.
"A diversidade precisa ser apoiada na Sociedade 5.0. Um time variado, por exemplo, tende a encontrar soluções mais rápidas para os problemas e de maneira criativa", diz.
UM CONCEITO QUE NÃO SE LIMITA AO JAPÃO
Por fim, Yoko explica que o conceito de sociedade 5.0 não é algo limitado ao Japão. Entretanto, uma sociedade superinteligente terá que passar por alguns desafios antes de se consolidar, além de ter metas bem definidas.
“A Sociedade 5.0 é muito nova e de muita transferência. As tecnologias trazem alguns problemas estruturais, relacionados à segurança cibernética e à privacidade, por exemplo".
Ela explica, por exemplo, que o avanço da robotização pode sim, em alguns aspectos, causar danos ao mercado de trabalho. Portanto, o desenvolvimento desse tipo de sociedade vai ter que ser gradual e adequado às peculiaridades regionais.
O Japão, berço do conceito, já caminha em direção à sociedade do futuro. O país prevê grandes investimentos em tecnologias inteligentes em diferentes áreas.
Em robótica, por exemplo, são previstos US$ 87 bilhões até 2035. Foram fornecidos US$ 1,44 bilhão para financiamento em Inteligência Artificial para a Innovation Network Corporation of Japan, parceria público-privada formada pelo governo e 19 empresas.